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quarta-feira, julho 10, 2024
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Falta de dados prejudica tratamentos de saúde na população LGBTQ+

O câncer afeta a todos, mas não igualmente. Cada segmento da população apresenta taxas variáveis ​​de certos tipos de câncer, respostas diferentes às mesmas terapias e resultados amplamente divergentes. Isso tudo por conta de fatores socioeconômicos subjacentes, que influenciam no acesso a cuidados, e por conta de fatores biológicos, que influenciam na tolerância e na resposta aos tratamentos.

Algumas dessas disparidades estão muito bem documentadas, tanto na literatura científica quanto em relatos populares. Isso nos permite começar a aplicar estratégias direcionadas para pacientes de grupos vulneráveis ​​e tradicionalmente mal atendidos, de modo a fechar lacunas no acesso e no atendimento. 

Mas, para vários outros grupos, sabe-se muito pouco sobre seus riscos e experiências específicos. Ou seja: para começar a melhorar o tratamento e atendimento a essas pessoas, ainda há um longo caminho a percorrer no sentido de começar a fazer as perguntas certas sobre quais exatamente são os problemas.

Infelizmente, a comunidade LGBTQ+ se enquadra nessa última categoria. Quando se trata de pessoas não cisgênero, simplesmente não temos informações suficientes sobre os fatores clínicos e não clínicos que influenciam as taxas de câncer, o acesso aos cuidados, a participação em ensaios clínicos, os caminhos de tratamento e os resultados de longo prazo.

Como resultado, profissionais e empresas de saúde estão no escuro: não há como tomar decisões médicas baseadas em evidências para pessoas LGBTQ+ com câncer. Essa é uma disparidade gritante, dado que uma parcela crescente da população se identifica como LGBTQ+.

Resolver esse problema não será fácil, especialmente devido à natureza historicamente sensível e pessoal das identidades sexuais e de gênero. No entanto, existem várias etapas claras que podemos trilhar para coletar mais dados sobre os desafios e oportunidades enfrentados pelos indivíduos LGBTQ+, para que possamos começar a realmente enfrentar as disparidades no atendimento.

O QUE SABEMOS

Estudos recentes encontraram taxas mais altas de câncer de pele em homens gays e bissexuais, enquanto mulheres lésbicas e bissexuais são mais propensas a relatar câncer de orofaringe, linfoma de Hodgkin e câncer cervical do que mulheres heterossexuais. Além disso, o tabagismo, um conhecido fator de risco para vários tipos de câncer, é maior entre os indivíduos LGBTQ+ do que entre os heterossexuais.

Quase todos esses estudos vêm com a ressalva de que, devido a dados incompletos sobre orientação sexual e identidade de gênero, os resultados são menos confiáveis ​​e provavelmente subnotificam as disparidades.

Isso porque, atualmente, não existem grandes bancos de dados ou pesquisas sobre câncer que coletem rotineiramente informações de identidade sexual e de gênero, de acordo com a National LGBT Cancer Network.

Além disso, o conhecimento insuficiente do setor de saúde sobre como os fatores de risco socioeconômicos influenciam os resultados do tratamento acaba dificultando a oferta de apoio social, a garantia de acesso aos cuidados e as orientações a respeito de comportamentos críticos. 

Sem canais abertos de comunicação, as principais informações sobre orientação sexual e identidade de gênero (SOGI) nunca chegam aos dados do mundo real. São esse dados que usamos para estudar as disparidades de saúde, criar intervenções, desenvolver modelos preditivos e arquitetar ensaios clínicos mais representativos e inclusivos para examinar a eficácia de terapias promissoras em diversas populações.

TECNOLOGIA PARA ANÁLISE DA SITUAÇÃO

Uma combinação de estratégias de gestão da saúde da população e de ferramentas de análise avançada pode começar a desvendar padrões de atendimento e resultados, desenvolver cortes de pacientes clinica e socioeconomicamente semelhantes e, portanto, reunir retratos detalhados de tendências subjacentes na comunidade LGBTQ+.

Essa abordagem já foi bem-sucedida com outros grupos populacionais que enfrentam sérias desigualdades no tratamento do câncer, porque tendemos a ter dados mais robustos sobre outros elementos demográficos, como raça, etnia e geografia. Mas, primeiro, devemos começar coletando esses dados no prontuário eletrônico dos pacientes.

No entanto, as nuances dos dados de gênero e identidade sexual tornam a tarefa mais complicada, pois as pessoas se identificam de maneiras muito singulares. Equilibrar a necessidade de criar campos de dados estruturados para análise com o imperativo de reconhecer e honrar todo o espectro de identidades pessoais será um desafio contínuo para os cientistas de dados.

AUMENTAR O CONHECIMENTO COMPARTILHADO

A tecnologia é uma peça importante do quebra-cabeça, mas precisaremos fazer ainda mais para melhorar nossa visão coletiva sobre o papel da identidade sexual e de gênero no câncer.

Primeiro, devemos trabalhar em estreita colaboração com os defensores dos pacientes da comunidade LGBTQ+ para entender melhor as barreiras que eles enfrentam durante sua jornada de saúde. Ao identificar pontos problemáticos na comunicação com os profissionais de saúde, realizar exames, navegar no sistema de saúde e acessar o apoio social necessário para aderir ao tratamento e participar de ensaios clínicos, podemos começar a desenvolver uma ideia mais precisa de como superar desafios profundamente arraigados.

Em seguida, devemos reforçar a privacidade e a segurança dos dados confidenciais do paciente. Hospitais, clínicas e empresas farmacêuticas devem adotar medidas fortes e explícitas de privacidade e de segurança quando usam dados para ensaios clínicos. Também precisamos melhorar a educação do paciente e os protocolos de consentimento, para tornar claro e fácil compartilhar dados do mundo real com pesquisadores ou inscrever-se em ensaios clínicos apropriados.

Essas ações nos permitirão implementar novas estratégias de coleta de informações SOGI no prontuário clínico. Poderemos, então, aproveitar esses dados do mundo real para gerar uma imagem mais precisa e representativa de como é o câncer entre as subpopulações da comunidade LGBTQ+.

Tudo começa com um trabalho mais detalhado de coleta de informações SOGI. É imperativo que a comunidade de saúde quebre o ciclo de preconceito estrutural e discriminação que resulta em disparidades de saúde para pessoas LGBTQ+ e comece a ter conversas significativas e totalmente informadas sobre os resultados do câncer para alguns dos membros mais marginalizados e mal atendidos de nossa sociedade.


SOBRE O AUTOR

C.K. Wang é oncologista e diretor médico da empresa de dados oncológicos COTA. saiba mais

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